Bárbara Tinoco nasceu em Lisboa em 1998.
Em 2018 vimo-la nas provas cegas do The Voice Portugal, onde cativou o júri e o
público cantando uma canção de sua autoria, depois de saber que não tinha
superado a prova. A perseverança autodidacta da encantadora Bárbara na
actividade musical a nível da composição, execução e interpretação, desde os treze
anos (guitarra e canto), aliada aos actuais estudos superiores de Ciências
Musicais, fazem adivinhar um futuro promissor no meio artístico. Força de
vontade, estudo, talento – Bárbara Tinoco tem tudo para ser um caso de sucesso,
estando já marcados dois concertos para o mês de novembro de 2021 nos míticos
Coliseus dos Recreios de Lisboa e do Porto.
Bárbara Tinoco |
Este é o tempo de Bárbara, que já conta
com mais de sessenta e dois mil seguidores no Instagram, na sua maioria jovens.
As estações de rádio passam frequentemente canções suas que eu ouço com prazer.
E, todavia, há algo que me incomoda na canção Eu sei lá:
Eu
sei lá, em que dia da semana vamos/ Sei lá, qual é a estação do ano/ Sei lá,
talvez nem sequer queira saber/ Eu sei lá, porque dizem que estou louca/ Sei
lá, já não sou quem fui sou outra/ Sei lá, pergunta-me amanhã talvez eu saiba
responder.
E
eu juro, eu prometo e eu faço, e eu rezo/ Mas no fim o que sobra de mim?/ E tu
dizes coisas belas, histórias de telenovelas/ Mas no fim tiras mais um pouco de
mim/ Então força leva mais um bocado/ Que eu não vou a nenhum lado/ Leva todo o
bom que há em mim/ Que eu não fujo, eu prometo, eu perdoo e eu esqueço/ Mas no fim o que sobra de mim?
Mas
tu sabes lá, das guerras que eu tenho/ Tu sabes lá, das canções que eu componho/
Tu sabes lá, talvez nem sequer queiras saber/ Mas tu sabes lá, da maneira que
te amo/ Tu sabes lá, digo a todos que é engano…
Longe de ousar fazer qualquer tipo de censura
à actividade criadora de Bárbara Tinoco, que nem sequer se justifica neste
caso, não posso deixar de comentar a natureza do amor que envolve a
protagonista numa canção que é bonita por fora, mas que se a olharmos por
dentro vemos qualquer coisa que não bate certo, como uma discrepância nos
valores considerados adequados para os relacionamentos humanos. Há uma mulher.
Diz que ama e perdoa. Não vai a lado nenhum, apesar do seu parceiro estar a
contribuir para a desconstrução fatídica do seu eu interior, uma vez que ela é capaz
de dar tudo por amor e nada receber em troca. Em suma, ela dá todo o bom
que possui e o parceiro vai retirando bocados. O refrão insiste no
processo destrutivo da mulher e finaliza com a pergunta crucial: Mas no fim
o que sobra de mim?
Olha Bárbara, eu sei lá. O que eu
sei é que a violência no namoro e no casamento ainda está muito longe de ter
fim. Não sendo um fenómeno implicado directamente pelas canções que ouvimos,
também é verdade que Eu sei lá induz em erro e implica um estado de
rendição ao inadmissível. Já se percebeu que é uma bonita canção, mas também é
preciso implicar o poder de uma lírica na intervenção social, no sentido de
alterar essa rota humana tão ameaçada pela violência psicológica. Mais do que
fazer perguntas é preciso ter a coragem de dar as respostas. E voltamos sempre
ao círculo vicioso e desgastante da natureza do amor. Na verdade, só amar não
basta: é preciso amar e ser amado. É preciso cantar bem alto a
reciprocidade do amor. E não permitir que alguém leve de nós, mulheres, o
bocado que nos resta.
Adília César
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